Falta institucionalização para o combate à violência contra a mulher no Paraná. A avaliação é do deputado federal Dr. Rosinha (PT), após a passagem da CPMI da Violência Contra a Mulher por Curitiba, no domingo (24) e na segunda-feira (25).
Na noite de domingo, a CPMI reuniu-se com os movimentos feministas e na segunda-feira realizou diligências à Delegacia da Mulher de Curitiba e uma audiência pública na Assembleia Legislativa. Na audiência foram inquiridos representantes do Ministério Público, do Tribunal de Justiça, da Defensoria Pública e das secretarias de Segurança, Justiça, Saúde e Família.
Dr. Rosinha criticou, principalmente, a ausência de um núcleo que coordene as ações desenvolvidas pelas secretarias estaduais. “As ações ficam muito difusas, cada secretaria fazendo coisas isoladas, não há algo que unifique.”
O deputado criticou também o fato de o Paraná não ter uma gestora do Pacto Nacional de Enfrentamento da Violência Contra a Mulher, assinado em novembro de 2010. “Até onde sabemos, o Paraná é o único estado que não tem uma gestora para o Pacto”, informou.
De acordo com Dr. Rosinha, no entanto, a situação do Paraná não difere das dos demais estados brasileiros. “A realidade do Paraná é a mesma dos outros estados, de pouca institucionalidade no trato dessa questão”, comparou. Isso, porém, não pode ser motivo para acomodação. “Vimos hoje aqui serem apresentados projetos para o futuro. Espero que esse futuro seja já no ano que vem. O orçamento não foi votado ainda. Dá tempo de alterá-lo para financiar essas ações”, cobrou o parlamentar.
A CPMI da Violência Contra a Mulher vai realizar diligências nos dez estados mais violentos do país para as mulheres, além dos quatro mais populosos. O Paraná foi a sétima unidade federativa a ser visitada. As outras foram Pernambuco, Minas Gerais, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Espírito Santo, Alagoas e Mato Grosso do Sul. Na próxima sexta-feira (29) a CPI estará em São Paulo.
A baixa institucionalidade é também o motivo pelo qual inexistem dados confiáveis sobre os índices de violência contra a mulher no estado, o que inviabiliza o planejamento do combate a esse tipo de crime pelo poder público. Tanto é que, após quase 30 dias, os pedidos de informação feitos pela CPMI não haviam sido respondidos pelos órgãos do estado, com exceção da Secretaria de Saúde. “Solicitamos estes números e o Paraná não respondeu. Sem isso, como vamos saber qual é o índice de impunidade para esses crimes?”, questionou Dr. Rosinha.
Em 2011 foram abertos sete mil processos de violência contra a mulher no estado, dos quais 60% se encaixavam na Lei Maria da Penha. Destes, no entanto, apenas 5,5% foram concluídos com sentenças condenatórias. Cerca de 25% foram encerrados por prescrição ou decadência. “As denúncias se perdem pelo medo que as mulheres sentem, pela pressão que elas sofrem e pela ineficiência do poder público”, apontou Dr. Rosinha.
A CPI, no entanto, acredita ainda que o índice de impunidade seja muito superior, devido à incapacidade do pode público de coletar e organizar os dados.
Não há no estado, igualmente, uma padronização para a verificação de óbitos, o que faz com que mortes originadas de causas violentas acabem creditadas a outros fatores. “A mulher é esfaqueada, fica 30 dias na UTI, falece, e a causa da morte fica como infecção generalizada”, exemplificou Dr. Rosinha.
Os integrantes da CPI estranharam ainda a quase completa ausência de “tentativa de homicídio” na tipificação dos crimes cometidos contra a mulher no Paraná. “As mulheres aqui não sofrem tentativa de homicídio? Sofrem apenas lesão corporal ou morrem diretamente? Como explicar essa ausência?”, questionou a senadora e relatora da CPI, Ana Rita (PT-ES).
Na audiência pública, diversas questões feitas pelos membros da CPI ficaram sem resposta. A representante do Ministério Público, por exemplo, não soube responder por que menos de 10% dos Boletins de Ocorrência de violência doméstica registrados evoluem para denúncias do MP. A CPI deu o prazo de mais uma semana para que os organismos respondam a essas questões e aos pedidos de informação feitos anteriormente.
O Paraná é hoje o terceiro estado em assassinatos de mulheres, com um índice de 6,3 mortes anuais a cada grupo de 100 mil, acima da média nacional, de 4,4. O estado mais violento para as mulheres é o Espírito Santo, com taxa de 9,4, seguido por Alagoas, 8,3.
Piraquara, na Região Metropolitana de Curitiba, é a segunda cidade mais violenta do país em homicídios de mulheres, com taxa de 24,4.
Os dados são do Mapa da Violência de 2012, elaborado pelo Instituto Sangari e pelo Ministério da Justiça. O relatório completo pode ser acessado no site www.mapadaviolencia.org.br
“CPI chacoalha o poder público”
Um dos benefícios da CPMI da Violência Contra a Mulher, de acordo com Dr. Rosinha, é que ela “chacoalha” o poder público, forçando os governantes a assumirem compromissos para o enfrentamento desses crimes. A exemplo de outros estados, algumas medidas foram anunciadas na audiência pública realizada no Paraná.
O secretário de Segurança, Reinaldo de Almeida César, comprometeu-se a, até 2014, instalar pelo menos uma Delegacia da Mulher em cada uma das 39 regiões do estado. Cobrado pelo deputado Dr. Rosinha e pela presidenta da CPI, deputada Jô Moraes (PCdoB-MG), prometeu também rever já nos próximos dias o decreto de 1985 que criou essas delegacias. O decreto está defasado e em descompasso com a Lei Maria da Penha para a investigação de crimes de violência doméstica.
A desembargadora Denise Kruger, do Tribunal de Justiça, também se comprometeu com a instalação de mais juizados especializados em violência contra a mulher no estado. Hoje são apenas dois, em Curitiba e Londrina. A desembargadora não quis estabelecer um prazo, mas se comprometeu a enviar um cronograma de trabalho aos membros da CPI.
Críticas do movimento feminista
Ao fim da audiência pública, o microfone foi aberto para representantes de movimentos sociais feministas. Daracy Rosa, da Marcha Mundial de Mulheres, criticou a postura de alguns dos inquiridos pela CPI, que defenderam o tratamento de agressores, citando atenuantes como alcoolismo, drogadição e distúrbios emocionais. “O que alguns colocaram aqui hoje não é a mesma concepção que defendemos. Parece que o agressor é a vítima. Mulheres também têm distúrbios emocionais, mas nós não saímos por aí matando. Já o machismo mata todos os dias”, defendeu.
Daracy ainda reivindicou a criação de uma Secretaria de Políticas para as mulheres, a exemplo do que acontece no âmbito federal. “Não queremos que nossas demandas fiquem pulverizadas”, argumentou.